sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Genocídio sem limites na Colômbia

O governo não tem o menor interesse em esclarecer os casos dos 25 mil desaparecidos e das valas comuns com milhares de corpos; a mídia omite informações.

Bogotá - 26/01/2010


A própria Promotoria Geral do país reconhece que há na Colômbia mais de 25 mil desaparecidos, especialmente líderes de movimentos sociais, camponeses e lideranças comunitárias que desapareceram sem deixar rastros. Principal aliado do imperialismo na América Latina, o governo colombiano tenta esconder a identificação dos corpos enterrados em valas comuns pelo Exército a partir de 2005. A quantidade de mortos configura o mais feroz genocídio praticado nas últimas décadas por um governo fiel executor das políticas imperialistas na região.

No pequeno povoado de Macarena, região de Meta, localizado a 200 quilometros ao sul de Bogotá, uma das aéreas mais afetadas do conflito colombiano, foi descoberta a maior vala comum da história recente da América Latina, com uma cifra de cadáveres “NN”, enterrados sem identificação, que poderia chegar há dois mil, segundo diversas fontes, inclusive de moradores do local. Desde 2005, o Exército, cujas forças de elite estão nos arredores, tem enterrado atrás do cemitério local centenas de corpos sem identificação.É o maior enterro de vítimas de um conflito que se tem notícia no continente. Teria de se estabelecer um paralelo entre o holocausto nazista ou a barbárie de Pol Pot no Camboja, para se encontrar algo desta dimensão. Atrás do cemitério de Macarena, a 200 quilometros de Bogotá, se enterraram milhares de corpos sem identificação.O jurista Jairo Ramirez é o secretário do Comitê Permanente pela Defesa dos Direitos Humanos na Colômbia, ele acompanhou uma delegação de parlamentares ingleses até o local há algumas semanas e se empenhou em descobrir a magnitude da vala comum de Macarena. “O que nós vimos causa calafrios”, declarou ao Jornal Público. “Uma infinidade de inscrições NN e com fichas desde 2005 até hoje.”

Desaparecidos

Ramirez completa: “O comandante do Exército nos disse que eram guerrilheiros mortos em combate, mas a população nos diz que há inúmeros líderes sociais, camponeses e lideranças comunitárias que desapareceram sem deixar rastro”.A Promotoria anuncia investigações “a partir de março”, antes das eleições legislativas e presidenciais. Uma delegação parlamentar espanhola integrada por Jordi Pedret (PSOE), Inés Sabanés (IU), Francesc Canet (ERC), Joan-Josep Nuet (IC-EU), Carles Campuzano (CiU), Mikel Basabe (Aralar) y Marian Suárez (Eivissa pel Canví) chegou dia 25 de janeiro à Colômbia para estudar o caso e prepara um informe para o Congresso e o Parlamento Europeu. A situação da mulher, como primeira vítima do conflito, e dos sindicalistas (só em 2009 foram assassinados 41) vão centrar o trabalho em diferentes zonas do país.

Mil valas

O horror de Macarena tem chamado a atenção para a existência de mais de mil valas comuns de cadáveres sem identificação na Colômbia. Até o final do ano passado, os legistas haviam contabilizado 2.500 cadáveres, dos quais conseguiram identificar aproximadamente 600 e entregaram os corpos aos seus familiares. A localização destes cemitérios clandestinos foi possível graças às declarações de paramilitares presumidamente desmobilizados e acolhidos pela controvertida Lei de Justiça e Paz, que garante uma pena simbólica em troca da confissão de seus crimes. A última declaração foi de John Jairo Rentería, o Betún, que revelou perante o promotor e os familiares de vítimas que ele e seus aliados enterraram “ao menos 800 pessoas” na propriedade Villa Sandra, em Porto Asís, região de Putumayo. “Tinham de esquartejar as pessoas. Todos nas Autodefesas (organização paramilitar de extrema direita) tinham que aprender isso e muitas vezes se fez isso com as pessoas vivas”, confessou o chefe paramilitar ao promotor de Justiça e Paz.

“O governo não quer investigar”

Alfredo Molano, sociólogo e escritor, um dos colunistas mais influentes da Colômbia, tem sido o cronista da violência, o que o fez partir para o exílio, para escapar das ameaças dos militares e paramilitares. Leia o que ele diz:

Qual é a situação das valas comuns na Colômbia?

A própria Promotoria Geral de Nação fala em 25 mil “desaparecidos” , que em algum lugar tem de estar. Há cemitérios clandestinos enormes na Colômbia. Também é possível que tenham feito desaparecer muitos restos mortais como nos crematórios do nazismo.

Estas valas estão relacionadas com os chamados “falsos positivos”?

Sim, tudo isto pode estar relacionado com os “falsos positivos” (colombianos civis assassinados que eram apresentados como “mortos em combate”). O exército os enterrava clandestinamente. Boa parte deles vai ser encontrada nestas valas comuns.

Qual pode ser a magnitude das valas encontradas?

Terrível. Nem nos anos 50 houve na Colômbia tanta brutalidade como a que se evidencia com estas ações dos paramilitares, mas o governo não tem vontade de investigar a fundo e só deixará que apareçam algumas valas. Além disso, os prazos são elásticos e as dificuldades técnicas para as identificações, como provas químicas e DNA são enormes.

Andrés IdárragaJornal Público / Espanha

Publicado no sítio da Revista Caros Amigos
www.carosamigos. com.br


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